O COLETOR

A afirmação de fazer uma exposição com quase nada contrasta de forma interessante com o entusiasmo demonstrado por Raylander Mártis, quando este fala de suas ideias artísticas. O que de pronto pode-se notar é o traço indiscutível de uma urgência. Urgência de superação que aparece em tudo que o artista elabora em seu percurso poético visual.
Se atentarmos para o título da atual proposta, envolvendo a prática da coleta e seu consequente deslocamento, nos deparamos com a dinâmica do nomadismo interligando as várias propostas que constituem esse corpus complexo de imagens.
Parece que o jovem artista traz nas veias o ímpeto de desvendar mistérios ainda nem mesmo conscientizados por ele. Através de dispositivos simples, seu trabalho fala de um mundo físico ao alcance de quem deriva de uma realidade material quase precária, se quisermos considerar o contexto geopolítico periférico no qual o próprio artista se encontra.
Ativando a necessidade de superar o desconhecido, Raylander coleta ações, traços, atitudes, objetos, cores, meios variados, numa conexão com o coletor ancestral que todos carregamos; como uma consciência que se reconhecia parte do fluxo da Natureza, misturando-se e retirando daí seu sustento.
Sendo assim, entendemos como perspicazes as escolhas da marca de dois pés calçados como carimbo pessoal do COLETOR e da cor marrom como eixo cromático de seu guarda-roupas, tudo remetendo à condição telúrica de um corpo ávido para assimilar da Vida tudo que eclode como explosão orgânica.
É como se o corpo do COLETOR carregasse uma porosidade intrínseca, acolhendo facilmente qualquer tipo de fluxo, sem resistência, mas com um rigor intrínseco a expectativas estéticas íntimas.
Coletando, esse sujeito inventivo cria sua própria lógica de materialização da experiência, inaugurando uma metodologia arquivística própria, mais voltada para o existencial do que o científico. Deste modo, Raylander adensa sua presença física e cognitiva no mundo, almejando longos percursos em busca do inapreensível.
E já que é essa a vontade, vai caríssimo COLETOR! Enfrenta os mares raivosos! Cruza os desertos traiçoeiros! Reatualiza a saga de tantos que foram instigados pelos mesmos propósitos! Multiplica seu arquivo e emula Alexandria! Celebra o esclarecimento adquirido com a experiência! Mas não se esqueça de compartilhar esses grandes feitos com toda a humanidade!
Não endureça com o êxito que já desponta no seu caminho! Flexibilize, com alegria, o modo de perceber que se acumula com o vivido e aprenda a celebrar a inelutável ciência do fim como fonte infinita da invenção.
Belo Horizonte, 22 de julho de 2016. Marcos Hill